Será o primeiro superávit primário visto para o período desde 2015 e o maior saldo desde 2013
Impulsionadas pelos recordes de arrecadação e pela contenção dos gastos, as contas do governo central (Tesouro Nacional, Previdência Social e Banco Central) devem encerrar o mês de março com um saldo positivo de R$ 2,8 bilhões, aponta prévia calculada pelo Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (Ibre/FGV). A receita líquida avançou 22,1% no período, enquanto a despesa primária deve ter recuado 3,1%.
A estimativa é feita com base no Sistema Integrado de Administração Financeira (Siafi), do governo federal. O dado oficial do resultado primário será divulgado pela Secretaria do Tesouro Nacional na próxima quinta-feira. Os cálculos prévios, antecipados ao Valor, devem ser publicados no blog do Ibre nesta quarta-feira.
Se o resultado para março for confirmado, o saldo acumulado no primeiro trimestre chegará a R$ 25,8 bilhões, em termos reais. Será o primeiro superávit primário visto para o período desde 2015 e o maior saldo desde 2013.
“É um superávit que não vimos há alguns anos”, disse o economista Matheus Rosa Ribeiro, que elaborou os cálculos. “Mas é um número que decorre de aspectos que não devem ser considerados positivos.” Embora haja destaques tanto do lado da arrecadação quanto no da contenção de despesas, os fatores que contribuíram para o resultado envolvem custo social e aumento da incerteza econômica, comentou.
Ele cita dois fatores de incerteza. O primeiro é a menor previsibilidade no processo do orçamento público. A batalha em torno da peça orçamentária de 2021 colocou em xeque as regras fiscais, disse. O segundo é que a desvalorização cambial, que está relacionada à situação das contas públicas, acabou puxando para cima a arrecadação de tributos ligados ao comércio exterior.
Pelo lado das despesas, que recuaram 0,4% no trimestre, Ribeiro destaca os gastos com a covid-19. Somaram R$ 8,3 bilhões no período. É um valor inferior ao que o governo dispendia mensalmente com seus programas de enfrentamento à doença no ano passado. Programas o financiamento a empresas e o apoio ao emprego, que existiam em 2020, ainda não foram reeditados.
Além disso, a demora na sanção do orçamento de 2021 levou ao represamento de despesas. As chamadas discricionárias, que são aquelas não obrigatórias, recuaram 33,3% no primeiro trimestre. É, porém, uma contenção artificial dos gastos. Esses serão liberados ao longo do ano. Com o agravante que a demora na largada prejudica o planejamento e a execução das ações de governo.
A folha salarial, um dos principais itens de despesa do governo federal, ficou 3,9% menor no trimestre, comparado com igual período em 2020. A queda é resultado da Lei Complementar 73, que congelou os salários do funcionalismo em 2020 e 2021.
As despesas com a Previdência, por sua vez, avançaram 0,9% no período. É uma evolução menor desse item de despesa, por causa da reforma aprovada em 2019.
Pelo lado das receitas líquidas, que cresceram 7,8% no trimestre, o economista vê sinais de recuperação da atividade, principalmente com o crescimento do Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ) e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), de 29% e 14,9%, respectivamente. Apenas parte é explicada por recolhimentos atípicos dos tributos.
Por outro lado, a desvalorização do câmbio é a principal explicação para o aumento de 33,9% no Imposto de Importação, de 46,3% no Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) vinculado à importação e na alta de R$ 5,4 bilhões nos recolhimentos de PIS/Cofins sobre essas operações.
Por Lu Aiko Otta, Valor — Brasília (Com conteúdo publicado originalmente no Valor PRO, o serviço de notícias em tempo real do Valor)